No final do dia percebi que não havia trocado uma única palavra com um adulto.
O susto deu-se no momento que esperava o escolar do meu filho que o trazia de volta da escola. Os 7 minutos que seguiram depois dessa constatação foi de total empolgação com o momento que encontraria a moça que descia com ele e o entrega a mim. Era uma moça bacana que sempre trocava "meia dúzias" de palavras. O escolar apontou no fim da rua, ela o entregou a mim e saiu apressada. Pelo o horário que estava passando, deveria estar atrasada. Não tive sorte. Ela saiu correndo com o micro ônibus lotado de crianças suadas e cansadas da bagunça da escola. Conversei com o Samuel um pouco. Logo ele se distraiu com a TV e o desenho do Scooby Doo que meus filhos amam. Foram todos brincar e eu fiquei aqui, pensando o quanto me sinto solitária.
De manha acordei com o barulho do portão se fechando, era o marido saindo para o trabalho. Já havia dado café para quem estava acordado, naquele instante, só o Bernardo, que já estava no pé da cama querendo atenção. Acordei e logo vieram os afazeres do dia a dia. Ajeitar as coisas, almoço, uniforme, mochila e lancheira do Samuel. Quando vi já era 12h e logo a van passaria. Corremos um pouco. Fui para o portão e lá esperei. Ele entrou sem olhar para trás, empolgado com os amiguinhos. Voltei e haviam mais coisas para fazer. Acabar de servir almoço para os que ficaram e enquanto eles comiam, corri e tomei um banho gelado, que parecia me deixar mais forte. Coloquei a cabeça dentro d'água e por alguns instante, não dava para ouvir nada. Sabia que estava tudo bem com Bernardo e Luiza, que se comportam muito bem na hora do almoço, ficam lá sentadinhos comendo e conversando na linguagem que só eles entendem. Precisava desse banho, desses 2 minutos só meus. Me vesti correndo e fui almoçar, ou melhor dizendo, engolir a comida. Não ando cozinhando bem, sabe? Reflexo talvez desse meu momento de insatisfação com a vida. Logo depois Luiza dormiu. A coloquei no berço e percebendo a chatice do Bernardo, deitei ao lado dele para que adormecesse também.
Fechei os olhos por alguns segundos, ensaiei um cochilo, mas não podia. Logo era hora de buscar o Samuel e havia muito a ser feito. Passaram-se as horas e mais tarde percebi que além de passar o dia todo sem conversar com algum adulto, foram três horas sem dizer uma palavra, que foi o tempo que os meninos dormiram. O interessante nisso tudo é quanto mais ficava calada, mais gostava do silêncio. Não sou o tipo de pessoa que liga para as pessoas, que fala pelo cotovelos. Não mais. Creio que em pleno dia de semana, todos estejam ocupados demais para aliviar a solidão de uma mãe, não gosto de incomodar. Passam horas, dias, meses e continuamos aqui, sozinhas. No meu caso, há mais tempo ainda, por serem três crianças.
Quantas mamães passam suas tardes como as minhas? Ficam o dia todo sozinhas, sem trocar ideias, sem falar de suas futilidades ou aflições. E tem ainda a insatisfação de ouvir do marido ao chegarem do trabalho que estão cansados demais para conversar? Quem ai, como eu, se sente a pessoa mais só do universo? Ás vezes, no meio da tarde vejo a vizinha do prédio ao lado que acabou de ter bebê olhando pela janela, com os olhos perdidos no horizonte. Será que ela também se sente assim? Acho que sim. Sinceramente, creio que toda mãe tem seus dias de eremita, de isolamento total, contato com o mundo exterior. Não sabemos que dia da semana é, pois não nos importa, afinal, no nosso "trabalho" nunca tem folga, feriado ou fim de semana. Acho graça quando meu marido argumenta que é domingo ao contestar minha escolha em fazer alguma tarefa em pleno "dia de folga".
- Para você, né? Por que para mim sempre é dia de semana! - É minha resposta.
Há quem ache exagero dizer que, apesar dos problemas que todo mundo carrega no seu dia a dia, pelo menos dá para ver gente, conversar com outras pessoas, sair do ambiente fechado, espairecer da dureza da vida sentando em uma praça qualquer para descansar nem que seja por dez minutos em meio ao caos da vida corrida que levam. As mães não! Mães como eu e você não podem ter esse luxo. Luto pelo direito de sair sozinha, de às vezes pegar um cinema solitário. Sim, eu faço questão que seja solitário, sem marido e filhos, para poder viver o outro lado da minha vida. Parar em frente as vitrines que quero, olhar até cansar, escolher um filme na temática que quiser sem basear minha escolha na preferência dos outros e, principalmente, fazer tudo pausadamente. Não há nada que eu ame mais que fazer o que quiser e ainda devagar!
lembrei-me agora de uma conversa que ouvir por aí de um cara com um convite extra de um show bacana que a esposa do amigo adorava e oferendo para que ela fosse junto com a esposa dele.
- Ela não pode. Tem que ficar com o bebê. - O marido respondeu.
- Mas você não pode ficar com o bebê para que ela vá? - O amigo perguntou.
- Não. A vida dela agora é cuidar do bebê. Ela não pode mais ficar indo a shows como fazia antes.
- Haaa, tá. E como foi o show que você foi semana passada?
- Muito bom!!!
Fiquei chocada. Quer dizer então que a esposa que ele dizia amar não podia ter uma folga de toda essa loucura que é a maternidade? O que era isso? Punição? Ele não poderia, ou melhor, gostaria de ficar com filho que ele dizia idolatrar? Seria o velho caso do pai de instagram? Aquele que só sabe postar belas fotos para mostrar aos amigos, quando na verdade, não exerce a paternidade de forma ativa? Em dias assim eu levanto as mãos aos céus pelo marido que tenho. Perfeito? Nunca! Mas pelo menos desse mal eu não sofro!
Diferentemente do que pensam por aí, há um lado bom nesse nosso lado eremita. Passamos a selecionar as conversas que temos, abrimos mão de discussões furadas, aprendemos o quanto é gostoso passar um tempo à sós com um bom livro ou fazendo algo que se ama, enquanto os filhos dormem, e principalmente, finalmente passamos a entender e não mais criticar as mães que passam por situações semelhantes às nossas. Juntas somos mais fortes e quando compartilhamos o que sentimos em momentos como este, encontramos mães que se identificam e exercitamos a empatia uma com as outras. Sejamos unidas! Pois mesmo em momentos de solidão, estou com o pensamento em tantas outras que estão sozinhas em suas casas com suas crias, sofrendo do mesmo mal que vivo.
Para essas, uma frase: "Tamo junto"! rs!
Toda mãe tem seus dias de eremita
Published On
3/22/2016
By
Flávia Carvalho
Assinar:
Postar comentários (Atom)
0 comentários: