O que me mata mesmo são os sonhos engavetados, os desejos reprimidos, a vontade de às vezes fazer diferente, seguir outro rumo e não poder por causa dos meus filhos. Não, eu não sou aquelas mães amargas que reclamam de tudo. Sou feliz com meus filhos. Muitas vezes os pego no colo e fico olhando admirada, pensando o porquê de Deus me entregar aquelas preciosidades, na minha sorte em tê-los comigo alegrando e enlouquecendo os meus dias. Lembro da quantidade de mulheres que sonham com a maternidade ou estão com os filhos doentes em camas de hospitais. Penso nas mães que depois de experimentarem todo esse amor, perderam seus filhos de repente por causa de alguma fatalidade e agora estão com o ninho completamente vazio. Só de pensar e de tanto "treinar" minha empatia, dói. Olho para meus filhos saudáveis e graças dou a Deus por isso.
Porém, mesmo assim, sempre terá aquela espetada ao nos depararmos com sonhos e planos parados por causa das escolhas que fazemos. Parecem agulhas que ficam escondidas nas fotos de adolescente, quando ainda sonhávamos sem limitações, nas roupas antigas que já estiveram conosco em momentos especiais e que temos saudades, nem sempre do momento em si, ele foi vivido, aproveitado em seu tempo. Ás vezes a saudade é da leveza da alma que tínhamos. Hoje eu me sinto mais sobrecarregada, mais cansada. As dores nas costas me lembram dos sacrifícios rotineiros e que de tanto fazer parte, nem percebo tanto. Sento no sofá depois de um dia exaustivo e só lembro das dores. Tomo um dorflex e vou para a cama, afinal, amanha é outro dia e meu corpo tem que estar preparado para a ele.
Fecho os olhos e sorrio ao lembrar daquela viagem legal que fiz há muito tempo atrás, da saída com os amigos de escola, do barzinho com os amigos de faculdade, de como era viver na minha casa com minha mãe e irmão, da bagunça com os primos e almoços de domingo na casa da minha avó. Dá saudade do tempo que quando eu queria sair, simplesmente saía. Quando eu queria ia às compras as sacolas eram para mim. Dormia o quanto podia, o quanto o trabalho e estudo davam brecha. Todo o investimento de tempo e cuidado era para mim. Até as decisões mais drásticas como mudança de emprego, casa, namorado, visão da vida, tudo era baseado no que era melhor para o meu futuro.
Fonte: Arquivo pessoal |
- O que será deles? Quem irá cuidar caso alguma coisa me aconteça? E será que lembrarão de mim? Que tudo isso que passei foi por eles, por amá-los demais? Quem irá contar nossos momentos juntos? E aqueles em que ninguém estava presente? Quem irá contar das brincadeiras? Musiquinhas que inventada para alegrar e ensinar coisas simples como escovar os dentes. Quem? Quem?
Aquela aflição eu não me esqueço nunca. O medo não era da morte, do que viria à seguir, se todas as minhas crenças eram verdadeiras. O medo não era do que seria da minha alma depois. O medo era do vazio que o meu amor ou a falta dele traria à vida dos meus filhos. Era um amor mais forte que a morte ou do medo que tenho dela.
Eis um dos dilemas da maternidade: sofrer tanto com a possibilidade de nunca mais poder pensar em si mesma, levando-se em conta apenas seus desejos e ao mesmo tempo, adorar a sensação de nunca mais pensar no singular, nunca mais estar sozinha.
É uma responsabilidade muito grande e de tão natural, não pensamos ou não medimos o real sentido e significado desse peso. Todo esse sentimento nostálgico de dias que não voltarão jamais, esse lamento pelos lugares que adoraríamos visitar e por hora não podemos, as noites que gostaríamos tanto de sair com os amigos, o dinheiro gasto em fraldas que olhando bem, seria tão bem gasto se fosse com sapatos...
Tudo isso cai por terra quando olhamos bem no fundo dos olhinhos dos nossos filhos e eles parecem enxergar nossa alma. O mais bonito em tudo isso, é que mesmo enxergando todos os defeitos que temos, mesmo assim nos amam, nos admiram e por tanto tempo, ensaiam crescer e se parecer conosco. Como pode, né?
Em dias assim, mesmo cansada, olhando fotos de amigas que viajam o mundo ou investem em sua vida profissional, mesmo com uma pontinha de inveja, penso em tudo o que investi, na minha vida ou melhor, no que ela se tornou, o quanto está mais colorida e passou a fazer mais sentido.
Logo tudo isso irá passar, eu sei. E eu? Eu viverei cada instante dele por que eu sei que sentirei falta até dos segundos que perdi dormindo.
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